quarta-feira, 19 de maio de 2010

Irmãos Coen

Trailer - "Fargo" e "Onde Os Fracos Não Tem Vez"




ONDE OS FRACOS NÃO TEM VEZ (2007)


Estrelado por Javier Bardem, Tommy Lee Jones e Josh Brolin, Onde os fracos não tem vez (No country for old men, EUA, 2007) é um filme baseado no romance homônimo do escritor americano Cormac McCarthy.

O longa, ambientado no Texas em 1980, segue o veterano da guerra do Vietnam Llewelyn Moss (Josh Brolin) que, em uma de suas caçadas no deserto, se depara com um cenário curioso. Algumas caminhonetes estacionadas em círculo, corpos de mexicanos ensaguentados espalhados pelo chão – nem o cachorro do grupo foi poupado - e uma carga considerável de cocaína em uma das caçambas. Explorando um pouco mais o local onde, supostamente, uma negociação entre traficantes não saiu como o esperado, Moss também encontra uma maleta com dois milhões de dólares em dinheiro.

Desse ponto em diante, decidido a ficar com o dinheiro, Llewellyn é perseguido por bandidos mexicanos e pelo matador Anton Chigurh (Javier Bardem), um sujeito sem nenhum senso de humor e com grande facilidade para matar as pessoas que cruzam seu caminho. O xerife local, Ed Tom (Tommy Lee Jones) se depara com o cenário devastador do deserto pouco depois de Moss e, ao reconhecer sua caminhonete, vai a sua procura para entender um pouco o que aconteceu e alertá-lo sobre o assassino em série que o segue.

Aclamado pela crítica e tido como um dos melhores filmes dos irmãos Ethan e Joel Coen, Onde os fracos não tem vez é uma obra prima. Apesar do ritmo lento em que a história é narrada, o espectador não consegue se mover até o último minuto desse espetáculo. A brilhante atuação de Javier Bardem, vencedor do Oscar de melhor ator coadjuvante, merece um parágrafo à parte.

No início do filme, um policial apreende um homem na estrada com um tubo de oxigênio ligado a uma espécie de mangueira. O jovem policial, num enquadramento em primeiro plano onde podemos ver ao fundo o suspeito algemado sentado em um banco, liga para o chefe de seu distrito pedindo que ele venha avaliar essa estranha figura. Já nesse momento percebemos o brilhantismo da atuação e a natureza do personagem. O vulto do homem atrás do policial se levanta calmamente e, com muita paciência, espera o final da ligação. Sem a menor preocupação, ele se dirige ao policial e o enforca por trás com as algemas que o prendem. Enquanto assassino e vítima se debatem no chão da delegacia, vemos o rosto desse psicopata pela primeira vez, com os olhos arregalados e cheios de ódio. A expressão de Bardem no decorrer do filme é genial. Com seu tom de voz grosso e sério, o personagem não fala muito e não se altera, mas quando fica irritado ou nervoso, ele não deixa dúvidas na cabeça do espectador.

Tommy Lee Jones, como o experiente e desiludido chefe de polícia Ed Tom, também é excelente. Com seu sotaque texano carregado e sua fala mansa, o chefe é o exemplo de que, de fato, não existe país para os homens velhos (tradução ao pé da letra do título original do filme). Em um diálogo com um parente que vive em cadeira de rodas, Ed Tom conta que não entende no que a sociedade está se transformando, e lamenta o ritmo rápido com que as coisas mudam. Em resposta, o homem responde que sempre haverá assassinos psicopatas que surpreenderão pela sua frieza e calculismo. E acrescenta que não existe mais lugar no mundo atual para homens como ele.

Josh Brolin e Woody Harrelson também merecem destaque. Como o fugitivo com a maleta cheia de dinheiro, Brolin é responsável por trazer um pouco de leveza ao filme com alguns poucos momentos de humor. Um exemplo é quando Moss é perguntado sobre o destino do dinheiro e responde que gastou 1,5 milhão com prostitutas e uísque e o resto havia torrado com futilidades. Harrelson, apesar da participação curta, deixou sua impressão. Cara a cara com o assassino em um quarto de hotel, o nervosismo do personagem ultrapassa a tela e chega ao espectador que se encolhe com a expectativa do que está por vir.

Os irmãos Coen receberam o Oscar por melhor direção, roteiro adaptado e filme. Onde os fracos não tem vez é brilhante, extremamente bem executado e que deve ser assistido por todos os admiradores do bom cinema Hollywoodiano.

FARGO (1996)


Frances McDormand, William H. Macy, Steve Buscemi e Peter Stormare, estrelam Fargo (Fargo, EUA, 1996), filme de humor negro escrito e dirigido pelos irmãos Coen.
Em 1987, o vendedor de carros de Minneapolis, Jerry Lundegaard (William H. Macy) está atolado em dívidas. Sua mulher Jean, brilhantemente interpretada por Kristin Rudrüd, é filha de Wade Gustafson (Harve Presnell), um empresário milionário que não esconde seu desprezo pelo genro e que nunca o ajudaria com seus apertos financeiros. Desesperado e sem saber onde arranjar o dinheiro para pagar suas contas, Jerry viaja até a pequena cidade de Fargo e contrata Carl Showater (Steve Buscemi) e Gaear Grimsrud (Peter Stormare) para seqüestrar Jean e exigir um resgate em dinheiro de seu pai. Os seqüestradores acham que o resgate será de 80 mil dólares e que eles ficarão com metade disso como pagamento, mas Jerry pede um milhão ao sogro planejando ficar com o resto e resolver seus problemas.
Tudo corre como o previsto até que Carl e Gaear, dirigindo na estrada a caminho de seu esconderijo depois do seqüestro, são parados por um policial rodoviário que implica com a placa provisória do carro. Sem paciência para lidar com o assunto, Gaear atira na cabeça do policial que cai morto no chão. Enquanto Carl arrasta o corpo tentando escondê-lo, duas pessoas passam em um carro na estrada e assistem toda a cena. Gaear não pensa duas vezes antes de sair atrás dessas testemunhas e executá-las. Desse ponto em diante, são imprevistos atrás de imprevistos. A chefe de polícia grávida de sete meses, Marge Gunderson (Frances McDormand) investiga o caso e tenta resolvê-lo seguindo as pistas deixadas pelo caminho.
Em Fargo, percebemos a presença de um personagem recorrente nas obras dos irmãos Coen. Aquele com quem as coisas acontecem rapidamente sem que ele possa ter tempo de se acostumar com a situação ou até mesmo de entendê-la. A vida passa por ele sem que ele possa protestar ou mudar algo nela. Em Queime depois de ler (Burn after reading, EUA, 2008) e Um homem sério (A serious man, EUA, 2009) esse personagem aparece no núcleo principal da história. Ele provoca uma sensação de inquietude no espectador que, em certo ponto, completamente envolto no enredo, tem vontade de gritar pelo protagonista que não consegue se impor diante das situações que se apresentam. Jerry Lundegaard é essa pessoa com quem as coisas acontecem e vão se acumulando como uma bola de neve.
As atuações do filme são todas brilhantes com destaque para Francis McDormand, que levou o Oscar de melhor atriz pelo trabalho, como a simpática, engraçada e competente chefe de polícia Marge Gunderson. Steve Buscemi, como sempre, também está ótimo e é responsável por algumas partes de humor do filme até quando não está em cena. Ao serem interrogadas por Marge sobre a aparência dos assassinos, duas prostitutas que os haviam atendido na noite anterior, descrevem Carl Showater como “funny looking”. E como negar o fato de Steve Buscemi ser “funny looking”?
A trilha sonora composta por Carter Burwell teve papel importante no que diz respeito ao clima do filme. Logo na primeira cena onde um carro de reboque dirige calmamente pela neve forte que cai, o espectador já sabe que o que vem pela frente não é uma comédia leve e divertida para toda a família. Fargo levou os Oscar de melhor roteiro original e é mais um filme brilhante dos irmãos Coen que vale a pena assistir.

Quem entende do assunto - Tiago Alves

Um dos primeiros post que fiz quando criei o meu blog (www.tiagoalves.com/blog) foi uma lista dos 10 diretores que mais gosto. Lá eu explico que a lista tem alguns critérios. 1) Os diretores tinham que fazer parte da minha experiência com espectador de cinema, ou seja, diretores cujo os filmes fizeram parte da minha alfabetização cinematográfica. 2) Os diretores deveriam ter uma filmografia coerente. Sendo assim os Irmãos Joel e Ethan Coen não poderiam estar de fora.

Em 26 anos de carreira, os Irmãos, dirigiram 14 longas, e estão na produção do 15º. Algo notável pra produção de filmes independentes nos Estados Unidos. O que faz de sua filmografia algo único, é que apesar da pluralidade de gêneros, da comédia romântica ao musical, do filme policial ao drama, existe uma coesão na criação das tramas, nos personagens e, sobretudo, em uma visão sarcástica e crítica da sociedade americana. Carregado de humor negro, os filmes da dupla possuem a capacidade de criticar com sutileza toda a estrutura social e os arquétipos da sociedade de consumo. A figura do anti herói e a caricaturização das personagens principais, cria uma marca única ao estilo dos diretores.

Outra marca interessante do trabalho de Joel e Ethan é que seus filmes saíram de cultuadas obras primas que agradavam a um público seleto e alternativo, ao gosto do grande público. Assim as bilheterias dos seus filmes e o ritmo da produção, ultimamente eles fazem um novo filme a cada ano, vem crescendo exponencialmente. No entanto, mesmo com o reconhecido sucesso consagrado pelo Oscar de melhor filme e melhor direção para “No Country For Old Men – Onde os fracos não tem vez” (A conquista do Oscar já havia iniciado na carreira dos dois com Fargo, conquistando melhor roteiro e melhor atriz) a dupla se mantêm coesa às suas escolhas narrativas e estilísticas.

Tiago Alves - Cineasta e Diretor de Filmes Publicitário

Filmografia



  • 2009 - A Serious Man
  • 2008 - Queime Depois de Ler
  • 2007 - Onde os Fracos Não Têm Vez
  • 2006 - Paris, je t'aime
  • 2004 - The Ladykillers
  • 2003 - Intolerable Cruelty
  • 2001 - The Man Who Wasn't There
  • 2000 - O Brother, Where Art Thou?
  • 1999 - The Big Lebowski
  • 1996 - Fargo
  • 1994 - The Hudsucker Proxy
  • 1991 - Barton Fink
  • 1990 - Miller's crossing
  • 1987 - Raising Arizona
  • 1984 - Blood Simple

Biografia


Nos primeiros minutos de Fargo (1996) sobe o letreiro: baseado em acontecimentos reais. O filme, na verdade, é pura ficção. A “pegadinha” ilustra bem o humor sarcástico que define os trabalhos dos irmãos Coen. Autores de filmes como Gosto de Sangue (1984), Barton Fink (1991) e Onde os fracos não tem vez (2008), a dupla saiu de Minessota, cidade pacata do interior dos EUA, e conquistaram dezenas de prêmios em todo mundo por seus trabalhos no cinema.

A diferença de idade entre os irmãos é pequena. Ethan nasceu em 1957, três anos depois de Joel. A relação com a sétima arte começou cedo. Nascidos em uma família judia, a primeira câmera não veio de mão beijada. Joel cortou a grama de vizinhos durante meses e comprou uma Vivitar Super-8. Com o instrumento em mãos, eles refaziam filmes que viam na televisão. Filhos de professores, o currículo escolar dos irmãos Coen impressiona. Depois de se graduarem na Bard College at Simon’s Rock, escola para jovens com aproveitamento acima da média, Joel foi para a Universidade de Nova York, e Ethan para Princeton. Ainda na universidade, Joel realizou seu primeiro filme. Durante seus 30 minutos, Soundings mostra uma mulher fazendo sexo com o namorado surdo, enquanto fala sobre o melhor amigo dele, que ouve do lado de fora do quarto. Em 1979, Ethan se formou em filosofia e decidiu trabalhar junto ao irmão, que já realizava trabalhos em edição e assistente de direção. Juntos, eles fizeram seu primeiro filme, Gosto de Sangue (1984), que lhes rendeu um prêmio no festival de cinema de Sundance. O enredo marca o estilo Coen: um homem medíocre contrata um detetive particular para matar sua esposa e o amante dela.

Mais de vinte anos depois, eles já receberam Oscars (Onde os fracos não tem vez e Fargo), Palma de Ouro em Cannes (Barton Fink), entre outras premiações. Apesar do reconhecimento, os Coen são avessos ao lifestyle de Hollywood. Joel é casado com a atriz Frances McDormand, com quem adotou um filho, Pedro, que nasceu no Paraguai. Ethan é casado com a editora Tricia Cooke.

Famosos pela ironia peculiar, Joel já se declarou fã das pornochanchadas brasileiras, A preferida? O bem dotado homem de Itu (1978). Uma frase dos próprios Coen que sintetiza a visão deles:”Estamos nos lixando para o bom gosto”. E tudo bem.